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    • 29/09/2013 - Livros
      Pobre George

      Romance que não vendeu bem ao sair há 50 anos atrás, foi relançado há pouco tempo e merece uma olhada. é a vida como ela é para muita gente, apática, hipócrita, e desesperadoramente normal.

      AUTOR: Paula Fox

      LANÇAMENTO: 2009 (originalmene, 1967)

      EDITORA: Record

       

      Antes de falarmos do livro em si, vamos falar da autora: Paula Fox ficou famosa como escritora, não de romances adultos como este, e sim, como autora de livros infantis. Outro detalhe engraçado é que ela foi avó da cantora Courtney Love, viúva do Kurt Cobain, vocalista do Nirvana, morto em 1994.

       

      A capa desta edição é nublada, sem vida, e é perfeita para o livro.
      Mas falemos do livro. O cenário básico é o seguinte: um professor e sua esposa mudam-se para uma casa na área rural próxima à cidade norte-americana onde eles moravam, e onde ele dá aulas. A vida no subúrbio onde moram parece não ter muita graça, mas é mais barata do que na cidade. Eles têm uns vizinhos esquisitões, que formam famílias disfuncionais, e um casal cujo homem é um comunicador conhecido, e que tenta a todo custo encarnar o ideal da família bonitinha, aquela de comercial de margarina.

       

      O cenário bucólico do interior, sem as distrações e a agitação da capital, deixa o casal finalmente a sós, eles e a infelicidade de uma união sem filhos que já perdeu a graça há tempos. A vida deles é monótona. A paixão acabou há tempos, e a renda do professor não permite que eles façam grandes viagens, ficando limitados a destinos já conhecidos e manjados nas proximidades.

       

      George, morando distante de sua irmã divorciada e promíscua, passa a ter uma visão mais "de fora" dela e se exaspera com a mediocridade de sua vida.

       

      É uma coisa incrivelmente triste ver que essa vidinha sem rumo nem emoção não está sendo vivida por personagens velhos – George e Emma têm trinta e poucos anos, e a perspectiva de vida deles é passar ainda décadas nesse chove-não-molha, até que morram de velhos, entediados.

       

      Toda essa pasmaceira é quebrada quando Ernest, um jovem delinquente, invade a casa de George e este incumbe-se da missão de "salvar" o garoto, fazendo com que volte para a escola e recuperando-o para a sociedade.

       

      Aí começa o enredo do livro em si. Em alguns momentos, parece que veremos uma história de superação, daquelas que dão bons filmes da Sessão da Tarde. Em outros momentos, parece que George apenas tentou, desesperadamente, achar um sentido para sua vida, procurando onde na verdade não havia nada.

       

      Eu não vou passar mais spoilers, mas a parte final do livro é realmente intrigante, porque as máscaras e as frágeis estruturas que mantinham em pé as relações civilizadas entre os personagens principais começa a ruir. George e sua esposa, especialmente, saem de sua zona de conforto e encaram um pouco de "mundo cão", indo por um caminho sem volta.

       

      ANÁLISE DO LIVRO

      Paula Fox tem uma narrativa muito bem construída, mas meio estranha. Em alguns momentos, a trama "pula" momentos de transição e o leitor apenas imagina que uma nova cena começou. Por exemplo, em um momento os personagens dizem que têm que subir para se arrumarem para uma festa, e a gente espera que eles conversem no quarto, mas no parágrafo seguinte eles estão chegando à festa. São coisas que não comprometem o entendimento da coisa toda, mas, para um público leitor acostumado a narrativas que dizem o óbvio, parece esquisito.

       

      Os personagens são bem construídos, mas só até certo ponto. Ernest é bastante incoerente, mas talvez seja mesmo para ser assim. Os vizinhos são estereotípicos. Eu não "engoli" apenas Martha, que é uma perfeita louca depressiva mas no fim emerge como uma mulher perfeitamente controlada.

       

      Este é um livro escrito no final dos anos 1960. O clima de solidão e apatia é aterrador, há uma melancolia sem esperança no ar. A vida nos EUA naquela época, por incrível que pareça, era bem parecida com isso, para a maior parte das pessoas: com a tendência dos jovens irem fazer carreira longe de onde moravam seus pais, as pessoas iam se espalhando, e o americano médio perdia contato com irmãos, primos e amigos de infância, passando a conviver no dia-a-dia, basicamente, com a esposa e os filhos, e um ou outro vizinho ou colega de trabalho.

       

      Ao lê-lo, lembrei da experiência de ler "Extensão do domínio da luta", de Michel Houellebecq. Porque é o tipo de enredo que prende o leitor, bem escrito, sem linguagem rebuscada, sem meias-palavras, e com personagens e situações brutalmente realistas, mas sem dar mensagem nem lição de moral alguma.

       

      Para quem veio ao blog saber se deve ou não comprar o livro, resumo: Recomendo. Compre, leia, e venha aqui comentar.