Desde o meio da tarde, um grupo começou a se concentrar na entrada do Centro, na calçada do Amauri Tintas. Apesar da chuva, ficaram ali, exibindo faixas e cartazes. A manifestação parecia que ia ser um fracasso, porque até uns vinte minutos antes da hora marcada para começar, não tinha nem cinquenta pessoas.
Mas, de repente, como se fosse uma onda, uma multidão começou a surgir de todos os lados. Em instantes, a avenida estava trancada. Às 18h, como marcado, começou a caminhada. O pessoal ia avançando e gritando palavras de ordem, contra "a passagem mais cara do Brasil", e outras em crítica contra a empresa de ônibus da cidade; também haviam críticas à atitude do prefeito em deixar o local antes do protesto.
O grupo ia aumentando conforme avançava, com mais gente chegando e entrando no meio. Houve a inevitável parada em frente à Prefeitura, e neste momento, com certeza tínhamos mais de mil e quinhentas pessoas ali. Depois de darmos o nosso recado aos políticos na sede do poder (apesar de todos eles terem evaporado dali antes do ato), a turma seguiu adiante na avenida.
Fomos até a frente da Empresa de Transporte Coletivo de Viamão. Ali, claro, só se gritaram palavras de ordem contra a passagem e a superlotação. A empresa tinha uma verdadeira muralha de policiais na frente e circulando de moto nos arredores (nessa hora, lembrei daquela coisa marxista, de que, "no capitalismo, o Estado é a força de segurança do Capital").
Dali, descemos a Avenida Bento Gonçalves inteira. E eu lembro nitidamente do momento em que começamos a subir a rua, no final dela. Eu olhei para trás, e a multidão, apesar de compacta, e de a rua ser larga, se estendia para além de onde se conseguia enxergar. Naquele momento, com certeza, tínhamos ali bem mais que duas mil pessoas.
Essa imensa massa humana chegou à RS040, e trancou a estrada, sem que a polícia oferecesse qualquer resistência. Nenhum motorista tentou furar o bloqueio. Um cara estava levando a filha ao hospital, eu fui fazendo sinal, o pessoal compreendeu, abriu caminho para ele. Também não tivemos dificuldade em fazer passar uma ambulância da Prefeitura de Imbé, que devia estar indo a Porto Alegre passando por aqui. Não se pode negar passagem nesses casos, é o que eu acho.
Teve um abobado que botou um cartaz em cima do vidro de um micro-ônibus , e claro que com a chuva torrencial que caía, o papelão colou no vidro. Foi a coisa mais próxima de um "vandalismo" que tivemos. Eu senti que se o motorista ligasse o limpador de para-brisa, aquilo ia virar uma meleca e tirar a visão dele, causar um acidente, dar alguma merda. Então fui lá e arranquei.
Os ônibus, para evitarem o bloqueio, começaram a se desviar pelo Krahe, entrando na esquina do antigo Eclipse Dance. Teve uma parte da galera que foi para lá, fechar a brecha. Mas o bloqueio total não durou muito porque, a essas alturas, a multidão começava a dispersar.
O grupo que restou, muito pequeno, voltou pela avenida principal, e permaneceu em frente à Prefeitura gritando palavras de ordem. Por volta das oito e meia, sem nenhuma ação da polícia, sem nenhum político abrir a boca, sem nada, o grupo final foi dispersando, numa boa, dando fim à manifestação.
Foi um momento bonito, o despertar cívico de um povo tradicionalmente apático e desarticulado. Tinha gente ali falando de ônibus, tinha gente falando de homofobia, tinha gente falando de corrupção. Coseguimos concentrar uma multidão para lutar contra tudo o que está errado em Viamão e no mundo. Foi lindo. Ninguém foi preso. Ninguém quebrou nada. Quarta-feira que vem, às 19h, começa tudo mais uma vez.
PS: Quem chamou?
Incrivelmente, não foi nenhum partido político. A lista "oficial" de organizadores é a seguinte:
Rubens Rebés, Vitor Ávila, Leticia Motta, Fagner Pesch, Laura Cardoso, Gui Lopes e Gabriel Mendes. Nenhum deles detentor de cargo político nenhum.
E para encerrar... o Diário de Viamão publicou em seu site (na coluna do Guto) uma foto na qual eu apareço!